sexta-feira, 27 de junho de 2008

Explicando Política e Outras Coisas Aos Adultos

Aqui o vizinho do lado, do Terrear, brindou-nos com umas notas sobre a avaliação dos professores.
Em 12 tópicos, José Matias Alves (JMA) sintetiza algumas ideias sobre a regulação do 1º ciclo da avaliação dos professores.
Note-se que JMA exerce funções de membro do Conselho Científico para a Avaliação dos Professores. Por conseguinte, não se tratam de ideias de quem não tem nada a ver com o assunto, mas sim de ideias ou teses que, ele próprio,presumo, defendeu ou defenderá no órgão em que tem assento. Ou seja, nesta matéria JMA nunca estará isento de responsabilidades, para o bem e para o mal.
Por isso mesmo, pelo facto de JMA ter responsabilidades directas na matéria, não posso deixar de reprovar as suas “notas” sobre avaliação dos professores. Algumas são demasiado genéricas que não merecem comentário. Outras merecem comentário e reprovação por serem erradas e até perigosas para os professores.
Vamos a isso:
1 - A obrigação de uma credível e consistente formação em avaliação de professores para avaliadores e avaliados (não esquecendo que quem "faz" a formação também é a relação formadores-formandos);
Comentário: A formação que se venha a realizar nunca será "consistente e credível" uma vez que o processo de avaliação já se iniciou e a formação ainda não. Logo, a formação sobre avaliação dos professores é uma estratégia que serve dois objectivos apenas: dar a ganhar muito dinheiro a alguns formadores e silenciar as críticas de intempestividade que têm sido feitas ao ao processo de avaliação.

2. o número de parâmetros deve poder ser substancialmente reduzido, devendo definir-se um número mínimo e permitir-se que as escolas escolham mais um nº y, em função do seu projecto e dinâmica.
Comentário: A implementar-se esta ideia – que o ME afastou por pressão dos sindicatos e por contrariar clamorosamente ao ECD - a avaliação dos professores seria uma completa balbúrdia. Uns a serem avaliados por alhos e outros por bogalhos; o mesmo professor a ser avaliado este ano lectivo pelos parâmetros xpto e, no próximo ano, pelos parâmetros kywz. Num sistema educativo de cariz totalitário como o português, em que não há liberdade de escolha nem da educação nem da escola; em que a carreira é única e o empregador detém o monopólio dos meios, seria inadmissível utilizarem-se parâmetros diferentes de escola para escola e, no limite, de professor para professor. Além de que o "projecto e dinâmica" -interessante expressão esta -das escolas é ensinar os alunos e não avaliar os professores, presumo.

4. A vantagem formadora de uma avaliação realizada por pares. Mas, para além da formação indispensável, é necessário gerar condições de confiança e caminhar no sentido de evitar que os avaliados sejam mais qualificados e competentes que os avaliadores.
Comentário: O caminho está feito e o ME cometeu um erro de palmatória ao permitir que possam ser os menos competentes a avaliar os mais competentes. Bastaria isto, para que o ME, o CCAP e JMA tirasem conclusões mais profundas sobre este processo de avaliação.

5. o número de aulas a observar deve ser acordado entre avaliador e avaliado, em função de critérios a definir pelo conselho pedagógico da escola ou agrupamento (subentendo-se que pode haver circunstâncias em que não faça sentido a sua existência, como o Conselho Pedagógico deveria poder decidir).
Comentário: É um erro o Conselho Pedagógico ter responsabilidades na avaliação dos professores, ou seja, dele próprio. O Conselho Pedagógico deve ter responsabilidades pedagógicas e de avaliação, no que respeita aos alunos. O CP não tem responsabilidade na avaliação dos funcionários auxiliares, administrativos, psicólogos nem do restante pessoal da escola. Porque há-de ter na avaliação dos professores? Também é um erro crasso a avaliação dos professores depender, no mesmo grau, do director da escola e do coordenador de departamento. A César o que é de César. Obviamente só se deve perder tempo, repito, perder tempo, a assistir a aulas de professores quando se justifique e não anualmente como está previsto.

8. Os resultados escolares dos alunos não devem ser considerados no 1º ciclo de avaliação de professores por manifesta ausência de condições de equidade e de operacionalidade. Isto significa que as ponderações previstas deveriam ser reformuladas e toda a minuciosa arquitectura que está a aprisionar as pessoas e os contextos.
Comentário: Os resultados escolares dos alunos NUNCA devem ser considerados na avaliação dos professores enquanto dependerem directamente dos professores. Há um claro e insanável conflito de interesses. Não é de gente séria presumir que as notas que os professores dão aos seus alunos não vão ser condicionadas pelo facto de entrarem, também elas, na avaliação dos professores.

11. Todo o processo avaliativo não pode esquecer os seus fins, não se podendo transformar no seu próprio fim, no típico processo burocrático de inversão de valores.
Comentário: Claro que o processo de avaliação está transformado no próprio fim; claro que haverá uma inversão de valores; claro que não há nenhuma organização humana no mundo, nenhum empresa ou instituição que perca mais tempo e mais dinheiro com a avaliação dos seus membros do que com a missão que tem a cumprir. Ou que deixe de cumprir devidamente a sua missão para avaliar os seus funcionários.
Escreva JMA: o ME com o falso argumento de melhorar a qualidade da educação (e até admito que a possa melhorar alguma coisa) vai gastar uma imensidão de recursos humanos e financeiros a avaliar os professores. Diria até que, se as melhorias de qualidade fossem tangíveis, o que duvido, por cada 100 euros que o Governo gastar na avaliação dos professores retirará 1 euro de melhoria nos resultados educativos. Ou menos. Veremos se não é assim.
Reitor

7 comentários:

  1. Concordo com a sua análise.
    Portanto, teríamos que nos opor a tudo isto. Mas, já viu que não há praticamente oposição nenhuma? Só se discute se os "avaliadores" estão ou não preparados para a tarefa, se a nota do aluno entra ou não entra, se andaremos a grelha, a portefólio ou a gasóleo, discussão que acaba por significar aceitação do inquinado processo.
    Como diz o outro vizinho Ramiro (e até eu já disse muito lá para trás) se querem avaliar os professores que o façam pelas avaliações externas das escolas. A nós compete-nos arranjar formas de trabalhar melhor com os alunos que temos.

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  2. Cara Setora.
    A oposição faz-se quando há pão. Se não há pão, consome-se o tempo a provê-lo e fica-se sem tempo para a oposição. Desculpe trocadilho. É para reflexão.
    Bem. Nunca houve governo com a capacidade propagandística deste. Nem governo que seguisse uma estratégia tão global como este (em alguma coisa haviam de se distinguir...).
    Já viu que começou a discutir-se a avaliação e sai legislação sobre Direcção e Gestão das escolas?
    Agora tivemos o Euro...
    Os professores, os sindicatos, os blogues e tantos outros não conseguem acompanhar a verborreia legislativa deste Governo. Aliás, a estratégia política é clara: MUDANÇA TOTAL, MUDANÇA GLOBAL. Ou seja, mal se inicia a discussão de um assunto polémico, lança-se logo um outro novo assunto também polémico. Ou, mais refinada, lançam-se em simultâneo vários assuntos polémicos para a mesa: ensino especial, gestão, avaliação, titulares, enfim...
    Ninguém tem pachorra nem tempo nem disponibilidade para os discutir, para reflectir, para se lhes opor...
    Por outro lado, não há oposição porque não há acção. Espere até que os professores comecem mesmo a ser avaliados...

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  3. Já está a avaliação em marcha e está tudo pianinho. Bem sei que esta apanha sobretudo os contratados que não têm outro remédio.
    Julgo que na que virá a apanhar todos não vai haver quase oposição. Estão todos (quase) já a fazer os seus "arranjos" e salve-se quem puder.
    A avaliação foi a única coisa que fez mexer os profes. E, quando acharam que a coisa já lhes permitia algum "controlo", sentaram-se.
    Poucos se incomodaram com a aberração dos titulares. Acho que até ficaram contentes, ofuscados com o título.

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  4. E na verdade os spin doctors que apoiam esta governação são do melhor.

    Para prover o pão temos que escolher o caminho quando não cairemos tão podres quanto o sistema.

    Bom, tenho daqui do lado uma voz familiar que diz que o ceifeiro se agachava para a ceifa mas, acrescento eu,foi substituído pelas máquinas ceifeiras e debulhadoras.

    Já vou começar a delirar. O melhor é ir reflectir/dormir.
    Boa noite

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  5. Li este texto sobre a formação. Confesso, e não sou professora titular, que me sinto frustrada com o que se está a passar. Quantas vezes já pensei nos gastos que o Ministério faz, e a quase obrigação que os CE e os professores em causa se sujeitam, para aprenderem a avaliar. E, pelo conhecimento que tenho, grande parte das horas da formação, também será on line.
    Lamento que tudo isto esteja a acontecer. O trabalho é impingido e ninguém faz nada. As férias estão aí, o Ministério vai aproveitar-se. Quando dermos pela "coisa" já vai ser tarde. E o novo ano escolar vai ser duro. Afinal, as manifestações foram apenas para mostrar ao país quem somos? Nada mais foi feito,a não ser nos blogs, onde as pessoas dizem as verdades, como esta aqui muito bem explanada.
    Cumprimentos

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  6. A formação será um flop. Duvido que haja alguém no país que saiba avaliar professores de acordo com o modelo do ME. Talvez no Chile. :)

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  7. Gostaria de começar por dizer que concordo com quase todos os comentários!
    Sou professora não titular e só cheguei ao 7º escalão em Fevereiro quando fui "descongelada". Nestes últimos 3 anos pioraram as minhas condições de trabalho (decadência do parque escolar e violência e indisciplina a aumentar, já para não falar do declíneo do "prestígio" da profissão e do eclipsar do respeito social que lhe era inerente). Fomos 100 000 na rua, fizemos greves e manifestações espontâneas... O Conselho Nacional de Educação avalisou previamente o acordo indigno que os Sindicatos assinaram. Ainda há "setores" capazes de responsabilizar os professores pela actual situação?!

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